Formas Constitucionais

 

3.4 - Sentidos da Constituição

 

A Constituição pode ser definida em sentido jurídico, político e sociológico.

Sentido Jurídico – percussor Hans Kelsen – Nessa concepção, a Constituição pode ser entendida como o conjunto de normas fundamentais que exterioriza os elementos essenciais de um Estado. Para Kelsen, com base no sentido lógico-jurídico, a Constituição é norma hipotética fundamental.

Sentido Político – percussor Carl Schimitt – para ele a Constituição é a decisão política fundamental, não se confunde com leis constitucionais. Complementa que, a Constituição deveria cuidar apenas da estrutura do Estado e direito fundamentais.

Sentido Sociológico – percussor Ferdinand Lassale – para ele, a Constituição é uma soma dos factores reais de poder presentes em um determinado Estado.

 

 

4.1 - As formas constitucionais

Normalmente as Constituições são sujeitas a classificação, observando-se determinados critérios, quais sejam o conteúdo, a forma, o modo de elaboração, origem do processo de positivação, estabilidade ou mutabilidade, Quanto à sua função (função que a Constituição desenvolve no Estado) e Quanto à relação entre as normas constitucionais e a realidade política

 

Quanto ao conteúdo:

Constituição formal: regras formalmente constitucionais, é o texto votado pela Assembleia Constituinte, são todas as regras formalmente constitucionais estão inseridas no texto constitucional;

Constituição material: regras materialmente constitucionais, é o conjunto de regras de matéria de natureza constitucional, isto é, as relacionadas ao poder, quer esteja no texto constitucional ou fora

dele. O conceito de Constituição material transcende o conceito de Constituição formal, ela é ao mesmo tempo, menor que a formal e mais que esta nem todas as normas do texto são constituição material e há normas fora do texto que são materialmente constitucionais.

 

Quanto à forma:

Escrita: Consta de um documento escrito. Pode ser: sintética (Constituição dos Estados Unidos) e analítica (expansiva, a Constituição de Moçambique). A ciência política recomenda que as constituições sejam sintéticas e não expansivas como é a moçambicana.

Não escrita: é a constituição cujas normas não constam de um documento único e solene, mas se baseie principalmente nos costumes, na jurisprudência e em convenções e em textos constitucionais esparsos.

 

Quanto ao modo de elaboração:

Dogmática: é Constituição sistematizada num texto único, elaborado reflexivamente por um órgão constituinte é escrita. É a que consagra certos dogmas da ciência política e do Direito dominantes no momento. É um texto único, consolidado. Esta consolidação pode ser elaborada por uma pessoa (será outorgada, ex. na monarquia) ou por uma Assembleia Constituinte (será promulgada, ex. nos sistemas representativos, Presidencialismo e Parlamentarismo).

 

As constituições dogmáticas podem ser: ortodoxa (quando segue uma só linha de raciocínio, tem um único pensamento) e eclética (não há um fio condutor, temos dispositivos completamente antagónicos em razão da divergência que existiam entre os parlamentares, já que cada um visava os seus próprios interesses. - é uma dogmática que mistura tudo).

Histórica: é sempre não escrita e resultante de lenta formação histórica, do lento evoluir das tradições, dos fatos sociopolíticos, que se cristalizam como normas fundamentais da organização de

determinado Estado. Como exemplo de Constituição não escrita e histórica temos a Constituição do Estado chamado Reino Unido da Grã Bretanha e da Irlanda do Norte, sendo que a Grã Bretanha é formada pela Inglaterra, Irlanda e Escócia.

 

A Inglaterra tem uma constituição não escrita, apesar de ter normas materialmente constitucionais que são escritas. Portanto, a Constituição não escrita é, em parte escrita, tendo como característica diferenciadora que os seus textos escritos não estão reunidos, não é codificado, são textos esparsos e se eternizam no tempo, denominados Actos do Parlamento (ex. Magna Carta - datada de 1215)

 

Quanto a sua origem ou processo de positivação:

Promulgada: aquela em que o processo de positivação decorre de convenção, são votadas, originam de um órgão constituinte composto de representantes do povo, eleitos para o fim de elaborá-las.

Também chamada de populares, “democráticas”. A expressão democrática não deve ser utilizada como sinónimo de Constituição promulgada, não é denominação correcta. O simples fato de ser promulgada não significa que seja democrática. (Democracia = vontade da maioria, consenso). A constituição outorgada também pode ser democrática, se a maioria concordar com ela.

Outorgada: aquela em que o processo de positivação decorre de ato de força, são impostas, decorrem do sistema autoritário. São as elaboradas sem a participação do povo. Próxima a esta modalidade de constituição encontramos também uma referência histórica, a chamada Constituição Cesarista ou mistificada, não é propriamente outorgada, mas tampouco promulgada, ainda que criada com a participação popular. Formada por plebiscito popular sobre um projecto elaborado por um Imperador, ex. plebiscitos napoleónicos ou por um ditador, ex. plebiscito de Pinochet, no Chile.

 

A participação popular, nesses casos, não é democrática, pois visa somente ratificar a vontade do detentor do poder, sendo assim pode ser considerado um tipo de outorga (são impostas e ratificada pelo povo por meio de plebiscito para dar aparência de legítima).

Pactuadas: são aquelas em que os poderosos pactuavam um texto constitucional, o que aconteceu com a Magna Carta de 1215.

 

Quanto à estabilidadi ou mutabilidade:

Imutável: constituições onde se veda qualquer alteração, constituindo-se relíquias históricas – imutabilidade absoluta.

Rígida: permite que a constituição seja mudada mas, depende de um procedimento solene que é o de Emenda Constitucional que exige 3/5 dos membros do Congresso Nacional para que seja aprovada. A rigidez é caracterizada por um processo de aprovação mais formal e solene do que o processo de aprovação de lei ordinária, que exige a maioria simples.

Flexível: o procedimento de modificação não tem qualquer diferença do procedimento comum de lei ordinária Alguns autores a denominam de Constituição Plástica, o que é arriscado porque pode ter diversos significados. Ex.: as constituições não escritas, na sua parte escrita elas são flexíveis;

Semi-rígida: aquela em que o processo de modificação só é rígido na parte materialmente constitucional e flexível na parte formalmente constitucional.

A estabilidade das constituições não deve ser absoluta, não pode significar imutabilidade. Deve-se assegurar certa estabilidade constitucional, certa permanência e durabilidade das instituições, mas sem prejuízo da constante, tanto quanto possível, perfeita adaptação das constituições às exigências do progresso, da evolução e do bem-estar social.

 

Quanto à sua função (função que a Constituição desenvolve no Estado):

As três categorias não são excludentes, uma Constituição pode ser enquadrada em mais de uma delas, salvo a balanço e a dirigente que se excluem.

Garantia: tem a concepção clássica de Constituição, reestrutura o Estado e estabelece as garantias dos indivíduos, isto é, estabelece limitações ao poder.

Balanço: foi bem definida por F. Lassale na antiga URSS. A constituição é um reflexo da realidade, devendo representar o “Balanço” da evolução do Estado, o reflexo das forças sociais que estruturam o Poder (é o chamado conceito sociológico dado por Lassale). Seu conteúdo se contrapõe à dirigente.

Nesta base foi criada a constituição soviética o que se projectou para os Estados que seguiam a sua concepção. Para eles a constituição tinha que mostrar a realidade social, como se fosse uma fotografia = mostrar como é, portanto, a constituição do SER. EX.: A UNRSS teve três constituições, descrevendo três fases diferentes do Estado. A primeira em 1924 que a constituição do

proletariado, a segunda em 1936 chamada dos operários e a última em 1971 que foi a constituição do povo. A cada constituição era feito um novo balanço da evolução do Estado, tirada uma nova fotografia da situação actual. Estas considerações têm somente efeito histórico, porque a própria URSS não existe mais.

Dirigente: A constituição não apenas organiza o poder como também preordena a actuação governamental por meio de programas vinculantes.“DO DEVER SER” Esta constituição diz como deve ser as coisas e não como realmente é. Numa constituição dirigente há duas directrizes políticas para que seja possível organizar o Estado e preordenar a actuação governamental, que são: permanente (são as que constam da própria constituição) e contingente (são os Estatutos partidários).

Nos Estados desenvolvidos segue-se o Estatuto partidário como regras de actuação do poder, sempre obedecendo as normas da constituição que directrizes permanentes. Os estatutos de qualquer

dos partidos, cada um a seu modo devem obedecer sempre a constituição. Nos países em que temos dois grandes partidos a escolha das metas de governo é feita pelo eleitorado e efectivamente tem grande importância, já que os partidos têm planos de governo preestabelecidos - eles tem um estatuto

partidário a ser seguido. Para nós os partidos não passam de legendas, os nossos estatutos não são aplicados não tendo a sua real importância - aqui é uma bagunça só, cada um faz o que quer.

 

Quanto à relação entre as normas constitucionais e a realidade política (positividade – real aplicação):

Normativa: a dinâmica do poder se submete efectivamente à regulamentação normativa. Nesta modalidade a constituição é obedecida na íntegra, como ocorre com a constituição americana;

Nominalista: esta modalidade fica entre a constituição normativa que é seguida na íntegra e a semântica que não passa de mero disfarce de um estado autoritário. Esta constituição aparece quando um Estado passa de um Estado autoritário para um Estado de direito é o caso da nossa constituição de 1990.

Semântica: mero disfarce de um Estado autoritário

  

  • · GOUVEIA, J Bacelar, Manual de Direito Constitucional, Vol. I, 2aEdiçao, 2007;
  • · CANOTILHO, J.J. Gomes, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7ª Edição, Livraria Almedina, Coimbra, 2003;
  • · MIRANDA, Jorge, Manual de Direito Constitucional, Tomo II, 5ª Edição, Coimbra Editora, 2003